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O impactante “Uma Coisa Absolutamente Fantástica”, de Hank Green


Foto: Clara Mayrink

Em forma de ficção muito bem aproveitada, Hank Green coloca, neste seu livro de estreia, questões totalmente atuais. April May é uma típica jovem de classe média, que sai do interior para trabalhar em Nova York, onde atua como designer em uma empresa que a explora até o talo. Uma noite, saindo já de madrugada do trabalho, encontra uma instalação gigante em formato de robô, que não identifica de imediato, mas mesmo assim, resolve dar uma atenção especial a ele.

Com seu amigo Andy, April faz um vídeo despretensioso contando sobre esse novo objeto não identificado, que dá o nome de Carl. No dia seguinte, Andy e April descobrem que há vários “Carls” pelo mundo e o vídeo alcança números enormes de visualizações, por April ter sido a primeira a produzir conteúdo sobre ele. A história começa a se desenrolar por um caminho perigoso, dois lados são colocados e várias questões são debatidas.

April fica muito famosa e se torna uma porta-voz de um lado da história. Por tentar entender o motivo de terem vindo até aqui e defender que vieram para o bem, April conquista haters e passa a ser um alvo de fanáticos que não acreditam na bondade dos Carls e desejam eliminá-los. Ela começa a se encantar demais com a vida de famosa, em aparecer na televisão, ganhar likes e seguidores, o que a dava muito poder. Não importava os haters, só queria aparecer e ter poder. April tinha muitos problemas internos, relacionados com a sua forma de se relacionar com as pessoas, mas preferia não dar muita atenção a eles. Com a amplificação do seu poder, com seguidores, dinheiro e influência, esses problemas se intensificaram. Ela teve ainda dificuldade em lidar com os haters, com as pessoas em geral e até com ela mesma.

Depois de um tempo, April começa a ter um sonho repetidas vezes que depois se descobre ser “contagioso”. Para a jovem, esse sonho seria uma tentativa do Carl de unir as pessoas da terra, já que há enigmas que só podem ser descobertos em conjunto, que são necessárias muitas habilidades específicas e diferentes que nenhuma pessoa só reúne.

Foto: Clara Mayrink

O debate que se coloca em “Uma Coisa Absolutamente Fantástica” é como a sociedade reage ao ser alienígena, como cada um tem uma visão e um se coloca contra o outro. Jornalistas sensacionalistas e conservadores ganham espaço diante da “grande ameaça perigosa” e se reforça a ideia de “nós contra eles”, que é um debate central na política mundial atualmente. Acho que o livro encontra uma excelente analogia para debater esses temas de xenofobia, tão presentes em diversos debates, como nos EUA, país de Hank, e até aqui no Brasil, mais recentemente.

April tem a minha idade e circula em meios parecidos com os meus, apesar de a história se passar em Nova York. Isso porque ela estou artes, é envolvida com design, tem um amigo que produz conteúdos de podcats e Youtube. Isso tudo me ajudou a me sentir ainda mais próxima da personagem e, apesar de muitas vezes ela parecer uma filha-da-puta (ou talvez justamente por isso), me identifiquei com ela em muitos sentidos. Ela conta da sua vida conturbada na cidade grande, como é a vida em Manhattan, o que muitas vezes se parece com o Rio, que é também uma cidade grande, com muita movimentação de todo tipo. Há sempre muita coisa acontecendo e a gente acaba não prestando atenção em tudo ou não dando a devida atenção às coisas legais, o que quase aconteceu com April com os Carls, já que em Nova York coisas assim, de instalações de arte etc, acontecem todo o tempo.

O livro também fala bastante sobre a nossa confusa relação atual com a internet, que aparentemente ainda não aprendemos a usar. A imprensa e a internet são muito importantes para a história, já que ajudam a construí-la e influenciam nos passos seguintes. April passa a não se importar mais em falar a verdade ou usar evidências, por exemplo, porque é o discurso inflamado e dicotômico que atinge as audiências. E, diante dos cenários das últimas eleições que tivemos, não só no Brasil, como em outros países, é impossível não fazer esse paralelo tão claro, da narrativa dicotômica e maniqueísta. O autor coloca vários pontos “polêmicos” de forma didática e ficcional, o que talvez possa nos ajudar a elucidar problemas da vida real, por tomarmos certa distância dos fatos. Não que o livro dê soluções (muito pelo contrário), mas propõe esse debate.

Ao contrário de “Quem É Você, Alasca”, escrito pelo irmão de Hank, John Green, que demorou tanto para chegar no ponto central, que a primeira parte do livro fica um pouco arrastada, “Uma Coisa Absolutamente Fantástica” vai tão direta ao ponto que quase nos deixa desnorteados. Quase não nos afeiçoamos aos personagens no início, mas a história é tão envolvente e eu me identifiquei tanto com a personagem, que logo me identifiquei.

O livro não responde muitas perguntas que coloca e deixa um gostinho de quero mais, dando a entender que pode ter uma continuação e até se tornar uma série. Acredito que essa história também tem um excelente potencial de ser adaptada para o audiovisual e eu seria a primeira a querer assistir. Para mim, foi uma delícia de leitura, impactante e divertida.

Foto: Clara Maryrink

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Manu Mayrink é fanática por livros, filmes, séries, música e lugares novos.  A internet é seu maior vício (ao lado de banana e chocolate, claro) e o "Alguém Viu Meus Óculos?" é seu xodó. Ela ama falar (muito) e contar pra todo mundo o que anda fazendo (taurina com ascendente em gêmeos, imagine a confusão!). Já morou em cidade pequena e em cidade grande, já conheceu gente muito famosa e outras não tanto assim (mas sempre com boas histórias). Já passou por alguns lugares incríveis, mas quando o dinheiro aperta ela viaja mesmo é na própria cabeça. Às vezes mais do que deveria, aliás.

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