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“Sob os pés, meu corpo inteiro”, de Marcia Tiburi


Foto: Clara Mayrink

Antes de se lançar candidata ao governo do estado do Rio de Janeiro, a filósofa Marcia Tiburi já tinha escrito vários livros, alguns de muito sucesso, como “Como conversar com um fascista”, “Feminismo em comum” e “Ridículo político”. Entretanto, foi depois do conturbado período eleitoral que a gaúcha lançou “Sob os pés, meu corpo inteiro”, lançado pela Editora Record. O romance conta a história de Lúcia, uma mulher que teve sua vida dilacerada pela ação da ditadura militar no país.

Depois de anos, em uma São Paulo distópica, mas assustadoramente próxima da que conhecemos, Lúcia ainda não se recuperou de todo o horror vivido e segue em uma espécie de sobrevida, como se sua existência não mais fizesse sentido. Há uma confusão em relação ao que é a vida e a morte, são dois lados da mesma moeda do tempo.

Lúcia se apresenta ao leitor como tia de Betina, mas durante toda a narrativa há certa confusão em relação a seu grau de parentesco com a moça. Betina e Lúcia começam uma relação conflituosa, em que os fatos e sentimentos são meio obscuros e nada se explica direito. Ao contar sua vida para Betina, ela relembra momentos que tenta, mas não consegue esquecer, como a relação pouco amorosa com a mãe, o distanciamento do pai e, principalmente, o fato de sempre viver à margem e atrás de sua irmã Adriana, que Betina pensa ser sua mãe.

Lúcia é uma pessoa meio morta, meio viva; um fantasma da ditadura que não teve o direito de viver sua própria vida. Há essa confusão sobre quem é quem, quem viveu e quem morreu, quando na verdade, o que Tiburi busca mostrar é que isso pouco importa, porque ela na verdade apenas sobrevive, não tem autonomia para viver nada, não pode viver sua própria história. Sobreviver era a continuação da tortura. O momento que Lúcia relembra a tortura que sofreu quando foi presa por engano é o mais marcante de todo o romance. O relato das torturas e estupros são compridos, fortes e doloridos.

Tiburi se mostra pessoalmente ressentida, tocada e muito sensibilizada com todo o cenário político que se desdobra agora, de pessoas de pouca inteligência e muitas más intenções. A todo tempo faz diversas críticas políticas e sociais que dão tom de melancolia e tristeza para esse livro que tem um ar pesado. Críticas assustadoramente atuais como a falta de água, os moradores de rua, os muros pintados de cinza por um prefeito psicopata, um fascista no poder… Escrito em meio ao turbilhão que o Brasil anda vivendo, que destrói aos poucos direitos e cultura, Tiburi consegue aglutinar um pouco o nosso sentimento de angústia coletiva.

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Manu Mayrink é fanática por livros, filmes, séries, música e lugares novos.  A internet é seu maior vício (ao lado de banana e chocolate, claro) e o "Alguém Viu Meus Óculos?" é seu xodó. Ela ama falar (muito) e contar pra todo mundo o que anda fazendo (taurina com ascendente em gêmeos, imagine a confusão!). Já morou em cidade pequena e em cidade grande, já conheceu gente muito famosa e outras não tanto assim (mas sempre com boas histórias). Já passou por alguns lugares incríveis, mas quando o dinheiro aperta ela viaja mesmo é na própria cabeça. Às vezes mais do que deveria, aliás.

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