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O pesado, forte e emocionante “Filhas do sol”


Pôster "Filhas do Sol"

Baseado em fatos reais no Curdistão iraquiano, o francês “Filhas do sol”, que estreou no último dia 15 de agosto, se passa entre 2014 e 2015, quando o ISIS invadiu a área e 500 mil pessoas conseguiram fugir. Quem ficou, por volta de 5 mil pessoas, foi executado. Essas informações são dadas no início, mas pouco se fala nisso novamente ao longo do filme, pois não é o que mais importa na narrativa. “Filhas do sol” não foca nos motivos da guerra em si, mas, em uma perspectiva mais micro, fala de um esquadrão específico formado apenas por mulheres. E aí está sua grandeza.

Apenas uma diretora mulher, neste caso Eva Husson, para conseguir ter o olhar necessário para contar essa história. A fotografia trabalha com os olhares fortes, cheios de história e sentimentos, além da tentativa de retratar com sensibilidade esse ambiente de guerra, tão hostil e doloroso. A cena das tranças de Bahar (Golshifteh Farahani) refletidas ao sol, assim como os lenços coloridos nos cabelos delas são marcantes e dão razão ao título do longa. Não foram poucas as vezes que chorei copiosamente ao longo deste filme.

A narrativa começa com Mathilde (Emmanuelle Bercot), uma jornalista de guerra que é escalada para cobrir esse pequeno esquadrão de mulheres, lideradas por Bahar. Trata-se de um grupo de ex-prisioneiras, que se tornaram soldadas por diversos motivos. A história delas é terrível e muito difícil de lidar. Elas viram seus maridos serem assassinados, seus filhos serem levados para virarem soldados e elas se tornaram prisioneiras e escravas sexuais.

As razões para essas mulheres se alistarem são grandes, nobres. Bahar, por exemplo, se alistou para encontrar seu filho e para não ser apenas mais uma vítima da guerra. Não sabemos dos motivos específicos de cada uma das mulheres (o que é um grande problema do filme, que invisibiliza as outras mulheres em questão), mas sabemos que elas já passaram pelo pior da vida. O medo delas estava morto. São belas as cenas em que elas cantam músicas de guerra e morte, mas também de vida, voltadas à condição delas enquanto mulheres nesta situação. Elas se motivam umas às outras, se afagam e se apoiam.

As mulheres são fortes e duras, mas muitas vezes sem perder o carinho e a doçura. Elas se chamam de colegas e não há uma hierarquia oficial. Por mais que algumas autoridades sejam respeitadas, como a de Bahar, a chefe do grupo, todas se respeitam e se ouvem mutuamente, em harmonia.

A questão da exploração sexual é fortíssima no filme e o que me causa mais indignação. As mulheres são feitas de escravas sexuais e vendidas quando seus donos se cansavam delas. Isso porque eles gostavam das mais novas, crianças de 10, 11 anos, o que é assustador e me dá nervoso só de ouvir. Toca ainda na questão do jornalismo e como isso pode colaborar com o fim do conflito, ou não, já que as pessoas não se importam com aquilo que não vivem diretamente, como diz Mathilde em determinado momento. Ainda assim, defensora e crédula no jornalismo que sou, acredito ser esse ainda um papel crucial dentro da guerra.

O filme é forte, emocionante e sensível. Trata de uma guerra fora do eixo do eurocentrismo, um contexto em que já não nos sentimos à vontade muitas vezes. É ainda mais duro lembrar que essas situações ainda são recorrentes e seguem acontecendo. O esquadrão de “Filhas do Sol” e todas as mulheres vivendo em guerra têm uma esperança que desafia a condição humana. Elas não são coadjuvantes da história, como costumam ser vistas ao longo da história humana, mas sim donas de suas vidas.

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Manu Mayrink é fanática por livros, filmes, séries, música e lugares novos.  A internet é seu maior vício (ao lado de banana e chocolate, claro) e o "Alguém Viu Meus Óculos?" é seu xodó. Ela ama falar (muito) e contar pra todo mundo o que anda fazendo (taurina com ascendente em gêmeos, imagine a confusão!). Já morou em cidade pequena e em cidade grande, já conheceu gente muito famosa e outras não tanto assim (mas sempre com boas histórias). Já passou por alguns lugares incríveis, mas quando o dinheiro aperta ela viaja mesmo é na própria cabeça. Às vezes mais do que deveria, aliás.

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